quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

ÉTICA E LITURGIA

Texto de: Vulpes Az

Posso arriscar uma reflexão?
 
Estava aqui pensando com meus botões:
O que seria a ética? Na Wikipédia diz, mais ou menos, que a ética poderia ser um estudo dos valores morais e princípios ideais do comportamento humano perante a sociedade. Ao buscarmos a etimologia do termo chegaremos a alguns significados bacanas como "bom costume", "costume superior", ou "portador de car
áter".

A ética não se “esgota” na moral (que está contida no espectro da ética) mas busca a fundamentação teórica para encontrar o melhor modo de viver e conviver, isto é, a busca do melhor estilo de vida, tanto na vida privada quanto em público. Seria a ética uma “política de boa vizinhança”?

Claro que existem visões diferenciadas sobre o tema, por exemplo a ética platônica que buscava, em última instancia, o florecer da virtude. Nesse sentido a ética teria como finalidade conduzir o homem à prática do bem.

Diante deste bem, a vida do homem não pode ser uma vida fundada no prazer, mas uma existência que se volte para o bem. A ética embora, não tenha surgido de maneira sistemática com Platão, porém é com este apoiado no pensamento socrático que se dar inicio as especulações acerca da práxis humana em vista de um fim.

A ética, segundo Platão, deve ter por base a idéia da ordem ou da justa proporção que consiste em equilibrar elementos diversos que desemboquem no mesmo fim. Por exemplo, a justa medida entre o prazer e a inteligência, é por meio deste equilíbrio que as ações humanas atingem o bem. O bem na concepção platônica, não são as coisas materiais, mas tudo aquilo que permita o engrandecimento da alma, ou seja a busca da virtude.

Para não me demorar muito no comentário, relembro rapidamente da concepção Aristotélica, que, em suma, seu fim consiste em atingir a felicidade. Para isto é necessário que o sujeito estabeleça um meio termo entre os excessos que lhe afligem.

Por exemplo, a contemplação, o prazer e a política são vias de acesso do homem à felicidade desde que sejam em moderação. O cultivo das virtudes, assim como para Platão, também é fundamental na concepção aristotélica para que o homem atinja a felicidade que consiste em ter uma vida “perfeita”.

Nesse sentido poderíamos dizer então que a ética seria a melhor forma de viver e conviver em um meio humano pautando-se na busca da felicidade através do cultivo das virtudes. Bom, não sei para vocês mas isso me lembra uma coisinha dentro do BDSM: A LITURGIA


O que seria a LITURGIA? Mestre Ka comenta sobre o tema no seguinte sentido:
“O vocábulo liturgia tem origem grega e significa “coisas que se fazem publicamente”, ou “ação”. É, antes de tudo, ação expressa mediante palavras e gestos. Por isso, dizemos que a liturgia é feita de sinais sensíveis, ou seja, sinais que chegam aos nossos sentidos (tato, paladar, olfato, visão e audição) (...) ou seja, são os símbolos usados para enriquecer as práticas. São os papéis a representar, com os seus respectivos comportamentos. Tom de voz, posicionamento corporal, código de segurança, iluminação, instrumentos, acessórios etc. Tudo o que contribui para dar mais emoção, encantar e possibilitar uma melhor e mais profunda imersão em nossas fantasias.”


Além disso, a liturgia preconiza certos direcionamentos de conduta entre os praticantes do BDSM. Como o tratamento entre Tops, o tratamento de bottom sem coleira, o bottom com coleira, relação hierárquica entre Top (enquanto possuidor) e bottom (enquanto posse). Em suma a liturgia tem um afã de ser um cerne para os praticantes na busca das virtudes tão presentes na vivência BDSM como honra, responsabilidade, verdade, sensatez, etc além da busca pela melhor forma de viver e conviver dentro do mundo fetichista... mas espere... eu já não falei sobre isso lá acima?

A liturgia não é positivada, ou seja, não é “escrita” dentro de um código, tomo, bula, nem nenhum “documento oficial do BDSM” é uma tradição viralizada que se replica através da vivencia e da atuação dos próprios adeptos do BDSM. E é assim que deve ser.

Se o BDSM é uma experiência intrapessoal, ela é volátil e mutável infinitamente. Sempre falamos no “meu BDSM” pois por mais que você viva o BDSM com outro alguém(ns) a experiência, o sentimento, as vontades, os medos, os gozos, os prazeres são único e exclusivamente seus.

Nisso o conceito de um “código de ética” se torna absurdo, pois é totalmente impraticável.


Primeiro, quem escreveria? Quem teria a autoridade para tal?

Segundo, não seria imperativo. Ninguém seria “obrigado” a seguir e caso não o respeitasse quais seriam as imputações disso? Haveria sanções? Reprimendas? O mesmo já acontece com a liturgia, tem muita gente contra e que não quer nem saber, apesar de seguir certos ditames indiretamente e quando alguém comete um ato que vai contra esses princípios a reprimenda vem pelo próprio “meio”.

Terceiro, num universo tão gigantesco como é o BDSM um código seria suficiente para regular todas as possibilidades de acontecimentos? Não, nós nos valemos dos costumes, da liturgia, do bom senso, da moral, etc (e veja que tudo isso são “pedacinhos” do que seria a ética) e ao meu ver funciona muito bem, apesar dos pesares.

Acho que já estou sendo prolixo. O que eu quis dizer com isso tudo foi fazer esse paralelo. Etimologicamente ética e liturgia são distintos, mas nas experiências BDSM são empiricamente semelhantes.


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